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CAPA

PONTO DE PARTIDA (pág.1)
Renato Azevedo Júnior - Presidente do Cremesp


ENTREVISTA (pág.4)
Susan Greenfield


CRÔNICA (pág.11)
Fabrício Carpinejar*


SINTONIA (pág.12 a 15)
Neurociência e Filosofia


DEBATE (págs.16 a 21)
Todos os cidadãos têm o direito à saúde garantido?


EM FOCO (págs. 22 a 25)
Medicina sobre rodas


GIRAMUNDO (pág.26)
Curiosidades de ciência e tecnologia, história e atualidades


PONTO COM (pág.28)
Informações do mundo digital


HISTÓRIA (págs. 30 a 33)
Com 112 anos de história, Intituto Butantan é um dos maiores centros de biomedicina mundial


HOBBY (págs.34 a 37)
Médicos dedicam-se a escrever poemas


CULTURA (pág.38 a 41)
Pinacoteca de São Paulo realiza mostra sobre gravura brasileira


LIVRO DE CABECEIRA (pág.42)
Por Marco Tadeu Moreira de Moraes*


CARTAS & NOTAS (pág.43)
Medicina na Bolívia atrai grande número de brasileiros


TURISMO (págs. 44 a 47)
Cidades de Santa Catarina guardam um pouco da cultura europeia


FOTOPOESIA (pág.48)
Oscar Niemeyer


GALERIA DE FOTOS


Edição 62 - Janeiro/Fevereiro/Março de 2013

CRÔNICA (pág.11)

Fabrício Carpinejar*

Sol em demasia estraga a roupa

Festejo o céu azul, a claridade e o vento balançando mansamente as árvores.

Como toda dona de casa, vejo a esperança de lavar a pilha suja e esvaziar a cesta da lavanderia.

O dia limpo me traz bom humor. Movimentarei os armários dos filhos, a residência subirá os degraus das gavetas, além de assegurar a fragrância dos armários. Há uma diferença entre uma roupa com cheiro de sol e aquela seca pela máquina.

O sol é um perfume gostoso no linho. Um sachê natural e imbatível.

Acredito que não há como ficar deprimido com lençóis trocados, por exemplo.

Ninguém vai chorar em lençóis lavados, por uma questão de respeito, para não sujar e borrar o travesseiro. Uma muda nova resolve a depressão.

O capricho influencia nosso temperamento. Sou dengoso e cheio de explicações.

Não tenho respostas, mas explicações. Coisas de família. 

Alentava o costume de estender os trajes no varal de manhã, ir ao trabalho e recolher no fim da tarde.

Só que meu filho me advertiu que suas camisetas de futebol estavam fedendo. Concluí que fosse umidade. Uma precipitação no momento de buscá-la das cordas.

– Cheirando a cachorro molhado?

– Não, pai, cachorro tostado.

Eu gargalhei da resposta espirituosa, a princípio confundi com brincadeira, mas coloquei uma das blusas em contato ao meu rosto e exalava um odor de lareira.

Ao longo da semana, alterando meus horários, me dei conta que não bastava colocar a roupa ao sol, deveria retirá-la em seguida, assim que o tecido amornasse. Excesso de sol estraga as roupas. Fica esturricada pela exposição da luz. Quase um pano de chão, com sombras amarelas. Das rosas de pano, crescem felpas e espinhos a cortar a pele.

Não é um serviço automático, sempre igual, como achava antes. 

Roupa posta no sol do meio-dia às três da tarde esgarça, ondula, extravia sua maciez e os afagos das golas.

Roupa sob o sol escaldante arrebenta mais do que se estivesse ensopada na chuva.   

O abençoado solaço arruinava as trouxas da família. Uma injustiça comigo. Logo eu, impregnado de cuidado com os tipos de amaciante, marcas de sabão e fixação precisa dos prendedores nas pontas. 

E fui raciocinando que felicidade muito forte também não dá certo. A comemoração é um atentado. De uma brincadeira costuma pular para arruaça. 

A alegria requer educação, por mais paradoxal que seja. 

É um risco sério passar dos limites.

É na alegria que mais brigamos, mais discutimos o relacionamento, mais cobramos atitudes e exigimos reciprocidade. Terminamos por nos descuidar e ferir quem nos acompanha.

Somos selvagens, irracionais, egoístas.

É na alegria que perdemos o respeito, gritamos, pulamos. Como se ela concedesse um superpoder, uma imunidade, como se não participássemos mais das regras de convivência.

Se a tristeza é atenta, cuidadosa, generosa – afinal, existe a tensão das fronteiras -, a alegria é explosiva e desajeitada.

Temos que estender a alegria, mas recolhê-la a tempo de não machucar os outros. Mostrar o contentamento, repartir os abraços e motivos, e depois se aquietar por dentro. É uma notícia que deve aprender a virar segredo novamente. 

Em demasia, a alegria pode humilhar. Em demasia, pode machucar.

A alegria é uma onipotência infantil. Caímos na cilada de que nada nos segura e nos limita, nada nos prende, de que o direito de falar qualquer coisa e comemorar de qualquer jeito.

A alegria nos põe a culpar nossa companhia por não estar alegre.

A alegria julga, compara, distorce, rejeita.

A alegria rasga a etiqueta.

Alegria mesmo é não se fiar no céu azul. Não deixar de cuidar porque o céu está azul.

O sol é apenas um começo. A alegria é somente o começo. 
 

*Cronista e poeta, autor de “Ai Meu Deus, Ai Meu Jesus” (2012) e “Borralheiro” (2011), ambos da Bertrand Brasil


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