CAPA
PONTO DE PARTIDA (pág.1)
Editorial de Renato Azevedo Júnior - Presidente do Cremesp
ENTREVISTA (pág. 4)
Soren Holm - editor do Journal of Medical Ethics
SINTONIA (pág. 9)
Médicos e indústria farmacêutica
CRÔNICA (pág. 12)
Millôr Fernandes
DEBATE (pág. 14)
Aids: em discussão o tratamento profilático
MÉDICOS NO MUNDO (pág. 20)
As muitas guerras do dr. Filártiga
EM FOCO (pág. 24)
AVAAZ: protestos em um clique
HISTÓRIA DA MEDICINA (pág. 27)
Médico, torneiro mecânico e inventor
GIRAMUNDO (págs. 30/31)
Curiosidades da ciência e tecnologia, da história e de fatos atuais
PONTO COM (págs. 32/33)
Informações do mundo digital
SUSTENTABILIDADE (pág. 34)
Sacolas plásticas: uma história sem heróis nem vilões
LIVRO DE CABECEIRA (pág. 37)
Indicação da conselheira Ieda T. Verreschi*
CULTURA (pág. 38)
Pedro Almodóvar
MAIS CULTURA (pág. 41 )
A revolução romântica
HOBBY (pág. 42)
Sem efeito colateral
CARTAS & NOTAS (pág. 33)
SUS: Cremesp recolhe assinaturas
GOURMET (pág. 45)
Sabor de vida em família
FOTOPOESIA( pág. 48)
João Cabral de Melo Neto
GALERIA DE FOTOS
SUSTENTABILIDADE (pág. 34)
Sacolas plásticas: uma história sem heróis nem vilões
Ditados populares, muitas vezes, são sábios. Como diz um deles, nem tudo que reluz é ouro. Por exemplo, a decisão que baniu as sacolas plásticas dos supermercados de vários Estados, inclusive o de São Paulo – tomada em nome da preservação do meio ambiente – parece irretocável. Entretanto, especialistas ouvidos pela Ser Médico ressaltam que, se a intenção é realmente proteger o meio ambiente, a alternativa correta não é, simplesmente, banir as sacolinhas tradicionais, de polietileno de alta densidade. Como, por exemplo, ficará o acondicionamento do lixo? Bem, ele continuará a ser colocado em... sacos de plástico! O material destes pode ser, inclusive, pior, uma vez que sua produção ainda não está normatizada.
Então, mudou o quê? Para os donos de supermercados, muita coisa. As sacolinhas, supostamente gratuitas, tinham seu custo embutido nos preços dos produtos. Estes não tiveram o preço reduzido por causa da medida, ou seja, os consumidores continuam a pagar por elas. Mas, agora, têm também de comprar as “ecobags” (grande parte delas também de plástico) e os sacos de lixo, que evidentemente tiveram seu preço aumentado exponencialmente, pois a demanda está muito maior. Cereja do bolo: além de tudo, as redes de supermercados posam de ambientalistas. Realmente, um negócio da China.
Como diz o jornalista e especialista em Ciência Ambiental pela USP, Dal Marcondes, criador e diretor da revista digital e do Instituto Envolverde, nessa história não tem herói ou vilão. “A sacola em si não é boa nem má, tudo depende do que se faz com ela. Certamente não haverá ambientalista que se preze que seja a favor dela. Porém, o banimento pode ser mais um tijolinho de boa intenção a pavimentar o caminho do inferno. A discussão sobre o assunto foi absolutamente equivocada”, critica.
“Para que uma medida de proibição total do uso de sacolas plásticas pelo comércio possa efetivamente funcionar e ser benéfica ao meio ambiente, de forma abrangente, é preciso repensar todo o sistema de coleta de lixo nas cidades, a partir da Política Nacional de Resíduos Sólidos, lançada no ano passado”, ressalva Marcondes. No Brasil, continua, “as pessoas têm uma relação mágica com o lixo: basta colocar em uma sacola, amarrar e colocar na frente da casa, e ele desaparece. Ninguém se preocupa para onde ele vai. Na Alemanha, por exemplo, as pessoas levam seus resíduos até contêineres, pois se sentem responsáveis pelo seu destino. Há lugares que chegam a ter 19 deles, para diferentes tipos de materiais recicláveis”.
Como não temos uma infraestrutura similar, a eliminação das sacolas plásticas, aponta o especialista, “terá como impacto a falta de recipientes para descarte de lixo, principalmente orgânicos, nas casas de famílias de baixa renda. Elas precisarão comprar sacos de lixo e, possivelmente, muitas delas não terão recursos para isso”. O risco “é termos o lixo descartado de forma indevida em terrenos baldios, córregos e áreas públicas das cidades por pessoas sem alternativas ou irresponsáveis”, afirma Marcondes, ressalvando que, pessoalmente, há muito tempo não utiliza sacolas plásticas em suas compras.
Reuso de 100%
Pesquisa do Ibope, divulgada em 2007, mostrou que 100% das mulheres entrevistadas reutilizavam a sacolinha plástica como recipiente para descarte de lixo no banheiro, cozinha, pia e quintal. O reuso era maior nas classes C e D, com menos recursos para comprar sacos de lixo. Cerca de 20% das entrevistadas disseram, também, que guardavam ou armazenavam roupas, mantimentos e objetos diversos nas sacolas plásticas.
Apesar do reuso intenso, parte das sacolinhas era descartada de forma irresponsável, fazendo com que muitas delas chegassem aos córregos, rios e oceanos, causando males ao meio ambiente, inclusive a morte de animais. “É preciso um processo de reeducação. Não podemos, tampouco, encher apenas um terço da sacolinha ou os sacos de lixo e jogar fora. É preciso utilizar todo seu potencial”, recomenda Marcondes.
“Nós consumimos muitas coisas em plástico para as quais não nos atentamos”, ressalta o médico Paulo Saldiva, coordenador do Laboratório de Poluição Atmosférica da USP. “Nada é proibido de ser usado, desde que seja devidamente descartado e reciclado. Como cidadão, apoio a medida, mas ela está longe de resolver o problema do lixo sólido nas cidades”, diz.
A professora do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e doutora em gestão ambiental, social e desenvolvimento, Priscila Claro, afirmou – em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, em 31 de janeiro último – que “o impacto real em todo o ciclo de vida da sacolinha convencional e das alternativas disponíveis não foram devidamente considerados”. Acrescentou ainda que “várias pesquisas mostram o quanto a sacolinha convencional polui por ser derivada de um recurso natural não renovável, o petróleo. Outras, no entanto, indicam que, se reutilizada, pode até ser mais sustentável”.
Além disso, criticou: “o slogan Salve o planeta, no caso das sacolinhas, é apelativo e vazio”. Na sua opinião, “o governo, ao não ter uma estratégia articulada e estruturada em relação ao meio ambiente e à sustentabilidade de forma mais ampla, contenta-se com ações pontuais e fracas. O que mais incomoda é que, ao analisar os interesses em jogo, parece que os recursos naturais e a sustentabilidade estão sendo um meio, e não um fim”.