CAPA
EDITORIAL
Nesta edição, uma entrevista, inteligente e informal, com o bibliófilo José Mindlin
ENTREVISTA
José Ephim Mindlin: inteligência, lucidez e bom humor numa entrevista surpreendente!
CRÔNICA
Crônica de Artur Xexéu: Dr. Kildare versus Dr. Casey... Você lembra desses seriados médicos?
MEIO AMBIENTE
Estado do Amazonas: as comunidades indígenas e o (difícil) acesso à saúde
CONJUNTURA
A difícil rotina dos médicos intensivistas em UTI pediátrica é tema de tese de doutorado
SINTONIA
Veja o que diz Lynn Silver, subsecretária de Saúde de NY, sobre o sistema de saúde norte-americano
DEBATE
Debate sobre Custos e Qualidade no atendimento à saúde reúne Cremesp, HSL e Unimed
HOMENAGEM AO DIA DA MULHER
Texto de Isac Jorge Fº, rico em detalhes, traz a triste história das mulheres ditas "feiticeiras"...
GOURMET
Prepare-se para sentar-se à mesa e saborear duas receitas simples, mas deliciosas!
HOBBIE
Acredite: médico e artista cria nova técnica de pintura a partir da expressão de rabiscos
COM A PALAVRA
Pra descontrair, consulte o Pequeno Glossário de Chistes Médicos, de Christopher Peterson
TURISMO
Ilha Grande... ah... essa viagem você tem que fazer! Fotos e texto transportam você para lá, virtualmente...
CARTAS & NOTAS
Aqui, você tem um espaço aberto para comunicar-se com nossa editoria
LIVRO DE CABECEIRA
Para quem gosta de uma boa leitura, Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda
POESIA
Poesia de E. E. Cummings, do livro 40 Poem(a)s
GALERIA DE FOTOS
CRÔNICA
Crônica de Artur Xexéu: Dr. Kildare versus Dr. Casey... Você lembra desses seriados médicos?
A medicina de Kildare e Casey
Artur Xexéo*
Não tenho a mais pálida lembrança do obstreta que colaborou com a minha chegada ao mundo. Não me lembro também do pediatra que deve ter tratado meus sarampos e minhas cataporas. Portanto, o primeiro médico que conheci e que traçou o modelo do que eu até hoje imagino que deva ser um bom médico foi o doutor James Kildare, interno do Blair General Hospital.
Doutor Kildare é um personagem de ficção, criação do escritor americano Frederick Schiller Faust. Nasceu no cinema dos anos 30 do século passado como protagonista de dez filmes. Fez sucesso no rádio dos Estados Unidos na década de 50 e, enfim, chegou à televisão nos anos 60, onde foi herói absoluto entre 1961 e 1965. Nos Estados Unidos, ele existia na rede NBC. Aqui no Brasil, era líder de audiência na extinta TV Excelsior e deu as normas do que viria a ser o drama médico, um gênero que se mistura com a história da televisão.
Ele tinha um rival, o também jovem médico Ben Casey. Casey foi o jeito que a rede ABC encontrou para competir com o herói da NBC. Viveram quase o mesmo período. Casey durante 153 episódios. Aqui, os dois eram atrações da mesma emissora de TV. Mas era difícil bater a empatia de Kildare. Até por que, vivido pelo ator Vince Edwards, Ben Casey tinha uma atividade muito específica: era neurocirurgião. Kildare, na pele de Richard Chamberlain – no auge do sucesso, ele recebia 20 mil cartas de fãs por semana – era clínico geral. Em outras palavras, as doenças retratadas em Ben Casey eram mais ou menos sempre as mesmas. Em Dr. Kildare havia mais diversidade.
Não que Casey não tenha deixado seu legado. Todos os episódios começavam com alguns símbolos sendo desenhados num quadro-negro e um narrador definindo cada um. Foi assim que minha geração aprendeu como se simbolizava o homem, a mulher, o nascimento, a morte e o infinito. Mas as práticas do bom médico, a gente aprendeu mesmo com Kildare.
Para se entender o que era a medicina preconizada por Kildare é importante saber o que gerava o conflito no seriado. O chefe de Kildare lhe alertou uma vez: “Nosso trabalho é manter as pessoas vivas, e não dizer a elas como viver.” Faz sentido. Mas o que garantia o sucesso da série era o fato de Kildare nunca seguir a orientação do diretor de Blair. Ele tratava de se envolver com todos os pacientes e de tentar resolver suas vidas, independentemente de suas fichas médicas.
Para quem chegou agora, é difícil entender a medicina de Kildare. Com o sangue jorrando em todas as salas de Plantão Médico ou – pior – com o comportamento do médico que faz mais sucesso na TV de hoje, o doutor Gregory House, personagem que deu popularidade ao comediante inglês Hugh Laurie, o drama médico aparenta ser mais realista. House é mais específico ainda que Ben Casey, já que suas especialidades são a infectologia e a nefrologia. Mas ele fica conhecido mesmo por sua capacidade de fazer diagnósticos, o que transforma cada episódio do seriado em um filme de detetive. House, enfim, é uma espécie de Monk dos hospitais. Mas o pior é que House faz questão de não interagir com os pacientes. Prefere ficar de longe e exercitar seu mau-humor, seu sarcasmo, seu cinismo.
Médicos como House parecem mais adequados ao século XXI. Frios, competentes e distantes do paciente. O estilo afetuoso de Kildare não tem lugar neste mundo. Essa história de circular por hospitais imaculadamente brancos e de tratar de doenças que sempre têm cura não fazem mais parte dos dramas médicos. Mas muito mais que House, Kildare será sempre o modelo de médico da minha geração.
* Xexéu é colunista do jornal O Globo