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CAPA

EDITORIAL
Análise sobre Urgência e Emergência e entrevista com Tom Zé: destaques desta edição


ENTREVISTA
Tom Zé: "Persistindo os médicos, os sintomas deverão ser consultados"


CRÔNICA
Entre a saudade e a nostalgia - Tebni P. Saavedra


BIOÉTICA
Debate discute pesquisas com seres humanos


ENSINO
Renato Sabbatini aborda a reciclagem profissional de qualidade


SINTONIA
"A Teoria do Caos e a Medicina", por Moacir Fernandes de Godoy


ESPECIAL
Urgência e Emergência: situação crítica no sistema público de saúde


EM FOCO
Memórias de cárceres: Luiz Guedes e Eleonora Menicucci


COM A PALAVRA
Artigo do cardiologista Luiz Carlos Pires Gabriel


LIVRO DE CABECEIRA
Destaques: A Conquista da Felicidade e O Físico


CULTURA
Michelangelo - Lição de Anatomia


HISTÓRIA DA MEDICINA
A Medicina islâmica em Córdoba e Toledo


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Edição 29 - Outubro/Novembro/Dezembro de 2004

BIOÉTICA

Debate discute pesquisas com seres humanos

Muitos interesses... muitos conflitos...

Concília Ortona*

Conflitos fazem parte da rotina do humano. Quem discute que há sempre vários caminhos “atraentes”, algumas motivações a um ato e diversos remédios contra a dor? No entanto, situações complexas acontecem quando os dilemas atingem direta ou indiretamente outros semelhantes. E não são raras: basta olhar para os lados e ver os “choques” de conveniências em Saúde envolvendo, por exemplo, sistema e instituições; hospitais e profissionais e até médicos e pacientes – ou vice e versa.

Por isso, o tema vem ganhando espaço nas discussões de natureza ética e bioética, como a organizada recentemente pela
Câmara Técnica de Bioética e Centro de Bioética do Cremesp. Focada na tríade indústria farmacêutica/investigador/sujeito de pesquisa, procurou, entre outros objetivos, identificar qual é o principal problema na questão de conflito de interesses dentro desta relação.

- “É a não identificação do conflito; felizmente isso já vem sendo parcialmente sanado pelas novas regras de conflict disclosures para congressos, artigos etc. Mas, ainda assim, falta clareza na comunicação e na definição de procedimentos. É o momento de unir esforços e desmistificar a pesquisa clínica, pois, sem ela, não teríamos novos e melhores medicamentos. Mesmo quando existe um conflito, nem sempre o sujeito de pesquisa sai prejudicado. Entretanto, a sociedade pode sair, simplesmente pelo não-esclarecimento da situação em si”.
Sônia Dainese, da Aventis Pharma e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Farmacêutica (SBMF)

- “Disparidade de poder entre os envolvidos. Temos um laboratório farmacêutico capaz de investir trezentos milhões de dólares em um único produto e essa quantidade de dinheiro traz um conflito enorme. É preciso normatizar! Falando-se no pesquisador: se telefonam oferecendo viagem para participar de Congresso, levando a esposa, classe executiva... Por mais independente que seja, quando pensar num laboratório, vai lembrar daquele. Por outro lado, em cima dos participantes do ensaio existem os poderes do médico, da pesquisa e da estrutura de ensino”.
Dirceu Greco, titular do departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina/Hospital das Clínicas da Universidade de Minas Gerais (UFMG)

“É a pressão sobre nosso sujeito de pesquisa, cujo poder aquisitivo é baixo e a assistência à saúde é precária. Quando a indústria farmacêutica, por meio do pesquisador, acena à possibilidade de atendimento diferenciado e exames especiais, isso o fascina. Então, nosso paciente é um vulnerável, dono de uma autonomia bastante limitada. É o ponto fraco da engrenagem”.
Susie Dutra, psicóloga e representante de usuários
na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep)

- “O principal conflito de interesses entre a indústria, a pesquisa, o ensino e o médico deve-se à ruptura de princípios estabelecidos no país e até internacionalmente para a boa convivência entre médicos e indústria. Mas tais conflitos não lesam necessariamente o paciente que “está” voluntário: quando acaba o ensaio, costuma até perguntar se não existe outro estudo para entrar, querendo ganhar vale-transporte, vale-refeição e contar com atendimento diferenciado. Em geral, é um indivíduo de baixa escolaridade e que não costuma reclamar por seus direitos”.
Caio Moreira, presidente da Sociedade Brasileira de Reumatologia

- “Conflito de interesses sempre vai existir. O que precisa é que seja equacionado, para não causar danos a nenhuma das partes, principalmente ao sujeito de pesquisa. No caso da indústria farmacêutica, o principal conflito, uma questão presente no dia-a-dia, refere-se à destinação dos recursos. No Brasil não se pode pagar os participantes, como acontece em outros países. Então, para quem irá o dinheiro? Ao investigador? À instituição?”.
Eduardo Motti, diretor-executivo da Eurotrials,organização de consultoria e investigação da área da Saúde

“Conflito é uma situação em que o objetivo primário, que é a melhor assistência ao paciente, pode ser comprometido por outros interesses. Só que não obrigatoriamente dele decorrem danos. Sem dúvida nenhuma, os maiores surgem na questão financeira – apesar de ego, reputação, prestígio e projeção acadêmica também serem valores ponderados no ‘jogo’. Fora que, atualmente, com o escasseamento dos recursos públicos para pesquisa, cada vez mais os pesquisadores dependem da indústria farmacêutica e dos recursos de origem privada”.
Elma Zoboli, professora do Departamento de Enferma-gem em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem da USP

“No Brasil, o maior problema é o fato de que a indústria farmacêutica, com seus produtos novos, que são bastante caros, induz, por meio de reportagens, que o SUS, o Ministério da Saúde e as seguradoras paguem determinados tratamentos. Somos um país onde a doença cérebro-vascular mata muito e o controle é simples, baseado na redução da pressão arterial com genéricos. Porém, é uma doença que atinge pobres, sem força de organização. O que ocorre: outras doenças complexas (que não vão alcançar, necessariamente, grande impacto) e que demandam medicamentos mais caros, acabam privilegiadas”.
Paulo Lotufo, superintendente do Hospital
Universitário da USP (HU) e editor da Revista da APM


* Concília Ortona é jornalista do Centro de Bioética do Cremesp


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