“Falta de supervisão contínua e ausência de tutor são as falhas
mais graves”
O Programa Mais Médicos completou um ano, em 22 de outubro último, registrando novos riscos à saúde dos pacientes. Vulnerável já em sua conceituação – por dispensar os profissionais graduados fora do País de fazerem o exame do Revalida, capacitação adequada para a prática da Medicina no Brasil –, o programa apresenta outras falhas graves. Dentre elas, a mais preocupante é a falta de supervisão contínua e permanente (profissional responsável) e ausência de tutor (docente médico) para os intercambistas, desrespeitando os parágrafos I, II e III, do artigo 15, capítulo IV, da Lei 12.871, que criou o Mais Médicos.
Esta é a conclusão de apurada fiscalização feita pelo Cremesp, entre abril e maio deste ano, com intercambistas de 134 das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) do município de São Paulo, nas quais o Mais Médicos está presente. A amostragem, portanto, é significativa.
Mais do que um desrespeito à própria legislação do programa, esse descaso representa prejuízo e riscos aos cidadãos que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS), ou seja, à parcela mais vulnerável da população.
Dos 98 intercambistas entrevistados nas 75 UBSs pesquisadas, 23,47% jamais tiveram um só encontro com tutores. Outro dado estarrecedor: 24,49% dizem não ter supervisão e 19,39% afirmam desconhecer o tutor. Um complicador adicional é que há casos em que os intercambistas recebem supervisão de profissionais como dentistas ou enfermeiros, que, obviamente, não estudaram Medicina.
As condições precárias de trabalho às quais eles são submetidos também são gravíssimas. Nossos fiscais registraram carência de materiais e medicamentos e aparelhos que inviabilizam a boa prática médica, também gerando riscos aos pacientes. Só para ter uma ideia, 12% tinham medicamentos fora de validade; 14% não possuíam desfibrilador; em 80% a falta de medicamentos é frequente; e 28% não contam com sanitário no consultório de ginecologia e obstetrícia, entre tantos outros absurdos.
Fica evidente, assim, que o Mais Médicos dificilmente ajudará, de fato, o Brasil a superar suas carências em saúde. Isso só ocorrerá quando o governo tratar o exercício da Medicina seriamente, oferecendo aos profissionais condições adequadas à assistência responsável e resolutiva, além de um plano de carreira que estimule a atuação em áreas remotas e periféricas. Enfim, é necessário ter vontade política e compromisso social, itens que há tempos estão em falta no campo das políticas de saúde.
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