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Alerta Ético


NOTAS 2
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HISTÓRIA
Homenagem ao médico patologista Mário Rubens Guimarães Montenegro


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Edição 211 - 03/2005

HISTÓRIA

Homenagem ao médico patologista Mário Rubens Guimarães Montenegro


Um mestre da Patologia

Um dos principais nomes da pesquisa e do ensino da Patologia no país, o professor Mário Montenegro dedicou seus esforços à formação médica de qualidade no interior do Estado


O falecimento do médico e professor Mário Rubens Guimarães Montenegro, aos 82 anos, ocorrido no dia 11 de fevereiro de 2005, foi lamentado pela comunidade médica paulista, principalmente a da cidade de Botucatu.


Um dos principais responsáveis pela fundação, em 1962, da Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu (Fcmbb), que mais tarde ampliou-se para Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp/Botucatu), Montenegro era ex-professor livre-docente da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Fmusp), professor emérito da Unesp/Botucatu e um dos principais nomes da pesquisa e do ensino da patologia no Brasil.

Entre seus colegas da turma de 1946 da Fmusp estava o ortopedista e traumatologista Manlio Mário Marco Napoli, que lembra do início da amizade: “nos conhecemos no pré-médico, em 1939. Ingressamos na Faculdade de Medicina em 1941. Ele era um esportista, praticava nado, pólo aquático, velejava. Sempre alegre e aberto a novas amizades, tratava a todos com respeito e igualdade, por isso era muito querido”.

Napoli ressalta também a coragem de Montenegro: “ele lutava por tudo o que acreditava. No comício estudantil feito em 1942, no qual nosso grito de protesto era ‘morra Getúlio’, fomos recebidos a tiros, e Montenegro estava a frente, de peito aberto, carregando a bandeira da faculdade e a do Brasil. A valentia dele era evidente, não tinha  medo de nada, enfrentava todos os desafios”.

Da amizade entre os membros da turma nasceu o livro “Éramos 102...”, no qual foi feita uma biografia de cada representante da turma. Logo após a graduação, Montenegro ingressou como assistente no Departamento de Anatomia Patológica da Fmusp, na época chefiado pelo professor Ludgero da Cunha Motta.

Em 1954, fez aperfeiçoamento por quase dois anos no Departamento de Patologia do Peter Bent Brigham Hospital, da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Em seis meses de curso foi promovido de residente a assistente do departamento e integrou um dos grupos de pesquisa sobre nefropatologia. De volta ao Brasil, envolveu-se com os estudos internacionais sobre arteriosclerose. Surgiu daí sua tese de livre-docência no Departamento de Anatomia Patológica da Fmusp. Na vanguarda da Patologia, nessa mesma época defendia a introdução e a valorização das biópsias por agulha, particularmente de fígado, como importante arma diagnóstica.

Desligou-se da Fmusp em 1962, quando passou a ocupar o cargo de diretor da Fcmbb, deixando, porém, muitos discípulos formados. Um deles, o médico Thales de Brito, recorda-se: “trabalhei com ele por mais de dez anos, na mesma sala, em tempo integral, sem nunca termos tido uma desavença. Nós nos completávamos em vários aspectos: eu, pessimista, e, ele, um otimista, que assim permaneceu durante toda a vida”.

Thales não esquece os ensinamentos de Montenegro. “Aprendi com ele os passos fundamentais da especialidade e considero-me uma pessoa de muita sorte, pois recebi ensinamentos de uma pessoa honesta e ética, de conduta profissional reta e dedicado ao trabalho”.

Ensino no Interior
Em Botucatu sua atuação e influência foram tão amplas e marcantes que a congregação atual da Faculdade estuda dar o nome de “Casa de Montenegro” à instituição. Foi lá que o médico descobriu sua vocação como administrador.

A professora da disciplina de Nefrologia da Fcmbb, atual Unesp Botucatu, Dinah Borges de Almeida, que foi aluna de Montenegro na Fmusp e trabalhou com ele por quase 40 anos, ressalta: “ele dizia que éramos anjos rebeldes. Nossa rebeldia estava em tentar construir uma universidade em uma cidade que não possuía estrutura nenhuma e um número populacional muito pequeno”.

Como diretor da faculdade, Montenegro implantou um modelo de ensino que priorizava a qualidade, levando em conta princípios que considerava imprescindíveis como a disponibilidade em tempo integral dos docentes.

“Ele era uma pessoa compreensiva e entendia a dificuldade que todos tínhamos para mudar radicalmente nossas vidas pessoais e profissionais. Montenegro foi fundamental para o curso de Medicina da Unesp, buscou professores e montou a estrutura física adequada, pois quando a faculdade foi fundada ficava em um prédio vazio que havia sido construído para sediar o Hospital de Tuberculose; à medida que a faculdade se desenvolveu e solidificou, o professor pôde se dedicar mais à sua área, a Patologia, transformando a faculdade de Botucatu em um pólo do ensino dessa disciplina”, avalia Dinah.

Entre os docentes pioneiros atraídos para montar o Departamento de Patologia da Fcmbb estava o médico Marcello Fabiano de Franco, que lembra o início do trabalho: “começamos praticamente do nada a construir aquele que viria a ser um Departamento de Patologia que exerceu grande influência na história da especialidade no Brasil. Sob a visão e estímulo do mestre, tivemos todas as oportunidades para crescermos nas três áreas de atuação acadêmica: docência, assistência e pesquisa. Fizemos um departamento moderno e contemporâneo que aglutinou e formou numerosos professores, anátomo-patologistas e pesquisadores”.

Marcello Franco ressalta: “o legado que Montenegro nos deixa é imenso. Inteligência, visão ampla da patologia como especialidade multidisciplinar, sua enorme capacidade de aglutinar e de chefiar de maneira generosa. Deu todas as chances de crescimento para cada um de nós, estimulou que nos diferenciássemos, que estagiássemos no exterior, que fizéssemos a carreira universitária, sempre sem medo de que ficássemos melhores do que ele. Na verdade, tinha orgulho de nossas vitórias e conquistas. Nunca lutou por cargos de direção, de poder”.

O último legado acadêmico de Montenegro foi a fundação do curso de pós-graduação em Patologia, do Departamento, “Isso trouxe vigor renovado à pesquisa do grupo e à instituição. Neste projeto, foi importante a agregação ao grupo de  pesquisadores não médicos, ressaltando a importância da interdisciplinaridade na pesquisa em Patologia para enfrentar os desafios da moderna Patologia Molecular”, conclui Marcello Franco.

Aposentadoria
Após a aposentadoria, Montenegro continuou atuando normalmente, participando da rotina das reuniões de autópsia e como consultor em patologia do sistema nervoso central.

Como prêmio por sua atuação junto à população de Botucatu recebeu o título de Cidadão Botucatuense. Deixou a viúva Edy de Lello Montenegro, sua segunda esposa; os filhos Roberto, Álvaro e Renata, e os netos Érica, Silvana, Roberto e Karina.

Edy, além das boas recordações, guarda na memória uma das últimas frases que ouviu de seu marido: “estávamos fazendo um balanço da vida e ele me disse: ‘Estou morrendo, mas morro feliz porque de tudo o que fiz nessa vida não tenho nada do que me envergonhar’”.


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